País vê uma escalada na tensão entre os Poderes
O Poder Legislativo e Judiciário têm respondido, nesta semana, as críticas difundidas no vídeo da reunião ministerial do dia 22 de abril e os movimentos do presidente Jair Bolsonaro (Sem Partido). Na última quarta-feira (27), o ministro do Supremo Tribunal Federal, Alexandre de Moraes, autorizou operação da Polícia Federal no âmbito do inquérito das chamadas Fake News. Já na última terça-feira (26), o governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel (PSC) foi alvo de uma ação da Polícia Federal. Entretanto, um dia antes da ação, a deputada federal Carla Zambelli (PSL-SP), uma das principais aliadas do presidente Jair Bolsonaro (Sem Partido), antecipou em entrevista, que haveria operações da PF contra governadores. A resposta veio no outro dia quando a deputada se torna alvo da PF no inquérito das Fake News, em tom de que não há interferência na instituição.
A tensão entre os poderes é uma realidade no Brasil contemporâneo e pano de fundo da crise política vivenciada no momento em que o País enfrenta uma pandemia. No entanto, o conflito entre o Judiciário e o Executivo também se deu quando o ministro da Corte, Dias Toffolli abriu um inquérito para apurar fake news e disparos de mensagens ofendendo o Supremo. Essa ação intensificou quando o ministro Moraes assumiu o inquérito.
“O caminho regular é que a Procuradoria-Geral da República fosse acionada porque assim o Supremo não ficaria com esse caráter de investigador e punidor ao mesmo tempo. O que obviamente não seria de forma adequada dentro de determinados ritos. Até (procurador-geral Augusto) Aras pediu a suspensão desse movimento, mas muita gente considera ele chapa branca em relação ao governo Bolsonaro”, diz o cientista político Antônio Lucena.
A condução do inquérito tem sido motivo de controvérsia desde o ano passado. A então procuradora-geral da República, Raquel Dodge, pediu o arquivamento do caso em mais de uma oportunidade por possível afronta ao regramento das investigações vigentes no País. Aras divergiu dela parcialmente. Manifestou-se pela constitucionalidade da investigação, desde que com algumas limitações, como “estar adstrita à garantia da segurança dos integrantes do tribunal e contar com a participação do Ministério Público, única instituição com atribuição de propor ações penais”.
Na visão de Lucena, essas ações do Supremo é uma reação clara. “As instituições reagem quando são ameaçadas e provocadas. O que a gente teve recentemente foi uma grande quantidade de apoiadores de Bolsonaro defendendo o fechamento do Congresso, a reunião ministerial em que o ministro da educação defende a prisão dos ministros do Supremo, isso deve ter sido um gatilho para que o STF tivesse uma ação bem mais dura contra essas pessoas”, destaca o cientista.
“Tivemos recentemente um discurso em que o ministro do STF Luís Barroso mandou recado quando assumiu o TSE em relação ao próprio Jair Bolsonaro; Rodrigo Maia também fez algo semelhante no caso da governabilidade. Ou seja, a incapacidade do governo Bolsonaro de construir uma coalizão estável e manter um mínimo de civilidade entre as instituições tem gerado esses movimentos de defesa que o supremo ele tem feito”, avalia Lucena.
“Se a intenção dessa operação não era ser uma resposta à operação contra o governador Wilson Witzel, certamente alimentará a crise política já estabelecida, que distancia o governo de uma agenda efetiva de combate ao coronavírus e seus efeitos na economia e na saúde pública”, avalia a cientista política.
Já o cientista político Alex Ribeiro analisa que a confiança nas instituições está cada vez menor diante da crise que assola o sistema jurídico e político. Por outro lado, a PF é uma das instituições mais confiáveis entre os brasileiros. E uma possível interferência, como no caso da declaração da deputada, é algo grave.
“A utilização da PF, com isso, pelo STF também é uma tentativa de trazer mais força diante da crise. A resposta do STF é justamente contra aqueles que querem deslegitimar o seu poder”, afirma Ribeiro lembrando que as Fake News ganharam força nas eleições de 2018.
“O aparato, como o gabinete do ódio, tinha como algo diversos atores políticos e instituições. Mas o Supremo só agiu quando a sua legitimidade estava sendo colocada à prova – a reunião ministerial do dia 22, e as manifestações dominicais em Brasília servem como os maiores exemplos”, destaca.
Ribeiro ainda explica que o poder colocado em dúvida é a ideia de centralização das operações da Polícia Federal e aparentemente enxergamos que existem várias PFs em uma só, como por exemplo, a que investiga contra Witzel que partiu de Brasília e outra que agiu ontem, contra aliados do governo. “Essa utilização da PF, em várias frentes, coloca em cheque a sua utilização tanto pela classe política quanto pela classe jurídica. E a tensão deve continuar”, alerta Alex Ribeiro.